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segunda-feira, 20 de abril de 2020

Um relato da época da Peste

Giovanni Boccaccio nasceu e morreu na Itália no século XIV e escreveu, como uma de suas principais obras, o Decameron, que é um conjunto de 100 contos tendo como pano de fundo a peste negra. Vamos apresentar abaixo um trecho do Decameron. Trata-se de uma narrativa da peste. O texto contém expressões que podem soar estranhas ao leitor da atualidade, mas não podemos esquecer que foi escrito há mais de 600 anos, entre 1348 e 1353.

”Afirmo, portanto, que tínhamos atingido já o ano bem feito da Encarnação do filho de Deus, de 1348, quando, na mui excelsa cidade de Florença, cuja beleza supera a de qualquer outra da Itália, sobreveio a mortífera pestilência. (...)

Na cidade de Florença, nenhuma prevenção foi válida nem valeu a pena qualquer providência dos homens. A praga começou a mostrar quase ao principiar a primavera do ano referido, de modo horripilante e de maneira milagrosa, os seus efeitos. (...) A entrada nela (na cidade) de qualquer enfermo foi proibida. Muitos conselhos foram divulgados para a manutenção do bom estado sanitário. (...)

A peste, em Florença, não teve o mesmo comportamento que no Oriente. Neste, quando o sangue saía pelo nariz, fosse de quem fosse, era sinal evidente de morte inevitável. Em Florença, apareciam no começo, tanto em homens como nas mulheres, ou na virilha ou na axila, algumas inchações. Algumas destas cresciam como maçãs; outras como um ovo; cresciam umas mais, outras menos; chamava-as o populacho de bubões. Dessas duas referidas partes do corpo logo o tal tumor mortal passava a repontar e a surgir por toda a parte. Em seguida, o aspecto da doença começou a alterar-se; começou a colocar manchas de cor negra ou lívidas nos enfermos. Tais manchas estavam nos braços, nas coxas e em outros lugares do corpo. Em algumas pessoas, as manchas apareciam grandes e esparsas; em outras, eram pequenas e abundantes. E do mesmo modo como, a princípio, o bubão fora e ainda era indício inevitável de morte futura, também as manchas passaram a ser mortais, depois, para os que as tinham instaladas. (...)

Esta peste foi de extrema violência; pois ela atirava-se contra os sãos, a partir dos doentes, sempre que doentes e sãos estivessem juntos. (...) Não apenas o conversar e o cuidar dos enfermos contagiavam os sãos com esta doença, por causa da morte comum, porém mesmo o ato de mexer nas roupas, ou em qualquer outra coisa que tivesse sido tocada, ou utilizada por aqueles enfermos, parecia transferir, ao que bulisse, a doença referida.”  


(Boccaccio, Giovanni. Decameron. São Paulo, Abril Cultural).

2 comentários:

  1. Excelente iniciativa desses competentes e queridos professores!

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  2. Caros colegas Herbert e Nathália,
    Gostaria de parabenizá-los pela ideia que tiveram e pelo belo trabalho que estão desenvolvendo por meio deste blog. A metodologia interdisciplinar, investigativa e contextualizada com o cotidiano presentes nos textos postados despertam a curiosidade do leitor. Os textos proporcionam uma leitura dinâmica e de fácil compreensão. As ilustrações levam o leitor a refletir mais profundamente sobre os temas propostos. Achei muito interessante a forma que relacionaram historicamente e biologicamente duas pandemias que aconteceram em épocas distantes da nossa história. Tenho certeza que este blog oportunizará aos estudantes um aprendizado crítico,reflexivo e investigativo. Aguardo ansiosamente por novas postagens. Divulgarei o blog para os meus alunos do IEMG e colegas de mestrado. Sucesso! Profº. Alexandre Diniz

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